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Quinta-feira, 03.12.15

Explorar petróleo e gás de xisto?

Embora considere que é absurdo estar-se a insistir na exploração de hidrocarbonetos quando há alternativas bem mais sustentáveis e a poluição gerada pela queima massiva de combustíveis fósseis é a principal responsável pelo aquecimento global, e portanto por boa parte dos problemas ambientais com que vamos ser violentamente confrontados num futuro razoavelmente próximo, não tenho uma oposição apriosística e por princípio a essa exploração. Penso que cada caso é um caso, e em certas situações até é capaz de ser preferível explorar-se do que não se explorar. Um exemplo: creio que provavelmente será melhor explorar-se comercialmente os jazigos de gás natural presentes em regiões polares, enterrados debaixo do permafrost, do que permitir que gases extremamente potentes em termos de efeito de estufa (bem mais do que o dióxido de carbono) sejam libertados livremente para a atmosfera quando o permafrost se fende ou derrete. Idem para o gelo de metano que existe em vastas áreas do fundo do mar, que, com a subida da temperatura deste, tende a sublimar e a ser libertado livremente para a atmosfera.

Ou seja: penso que bem regulada, muitíssimo bem vigiada, usando as técnicas mais mitigadoras possível dos impactos ambientais e em determinadas circunstâncias, a exploração de combustíveis fósseis pode ser até desejável. Em outras circunstâncias, porque uma economia não se torna sustentável de um dia para o outro, pode ser um mal necessário durante algum tempo. E em todo o caso sou de opinião que a informação é sempre bem-vinda. Informação sobre o que existe e onde, por um lado, mas também informação sobre o que se anda a fazer.

Foi por isso que quando, há dias, a associação Contramaré, de Portimão, organizou um debate sobre a prospeção e exploração de petróleo no Algarve, fiz questão de ir assistir. É desse debate o vídeo que abre este post. Transmitido primeiro em direto na internet e depois deixado em gravação no Youtube, o debate durou quatro horas e eu aconselho que o vejam. Não só os algarvios, embora a informação prestada tivesse sido, naturalmente, concentrada no Algarve: é que as concessões de prospeção ocupam uma boa parcela do território continental português e das suas águas, de Vila Real de Santo António a Caminha.

Saí do debate muito mais renitente a tudo isto do que entrei, o que, aliás, tem sido uma constante: quanto mais sei sobre o que se está a passar, menos gosto. A falta de informação e de transparência sobre o que se está e pretende fazer, claramente deliberadas, não auguram nada de bom. Os valores irrisórios que os contratos estabelecem de compensação e pagamento ao Estado português em troca da concessão são quase insultuosos e desmentem as apregoadas vantagens económicas da exploração. As consequências para a região, a sua economia e população, no caso de acidente, em caso de algo correr mal, são demasiado catastróficas para que possamos aceitar este processo com bonomia ou indiferença.

No mínimo dos mínimos, precisamos de muito mais prestação de contas por parte de todas as entidades envolvidas no processo, sem exceção. A começar pelas petrolíferas e acabando no governo, sem esquecer as autarquias e demais empresas, públicas, privadas ou assim-assim, que tenham alguma coisa a ver com o assunto. No mínimo dos mínimos. Sem isso, julgo que a única opção é fazermos fincapé e levantarmos o máximo de obstáculos que nos for possível levantar. Os porquês estão todos no vídeo.

 

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por Jorge Candeias às 20:54

Segunda-feira, 30.11.15

Salvar o planeta

Árvore Terra
Imagem daqui. O Mail sempre tem alguma utilidade

A expressão anda por todo o lado: salvar o planeta. É para salvar o planeta, diz-se, que é urgente combater as alterações climáticas. É para salvar a Terra, afirma-se, que há que proteger biomas, habitats, biodiversidade. É para salvar o mundo, defende-se, que é fundamental pôr travão na poluição, tapar o buraco na camada de ozono, regular as indústrias extrativas para que desastres como o de Mariana não voltem a acontecer ou nunca chegue a ter lugar a contaminação dos aquíferos que fornecem a escassa água de que dispõe o meu turístico Algarve, através do fracking que as empresas que andam a fazer prospeção dizem que não utilizarão mas que os contratos assinados expressamente permitem.

Lamento, mas a expressão está errada.

A questão não está em salvar-se o planeta, a Terra ou o mundo. A questão está em salvarmo-nos a nós.

O planeta não está em causa. Sobreviverá sem problemas às nossas alterações climáticas, à nossa poluição e à nossa destruição de habitats, como já sobreviveu a catástrofes muito mais graves e súbitas do que nós. Nem a vida no planeta está em causa. O que andamos a fazer ao planeta tem levado à extinção de muitas espécies e tudo indica que fará o mesmo a muitas mais mas, como aconteceu tantas vezes no passado, a extinção das plantas e animais que não conseguirem resistir-nos abrirá novas oportunidades evolutivas para as espécies capazes de se aproveitarem de nós. Até cenários de poluição extrema tendem a criar condições para o desenvolvimento de organismos capazes de se servir de toda a porcaria que vamos derramando no ambiente. Com tempo, e tempo haverá, o planeta acabará por sarar.

Só que acabará por sarar numa configuração diferente. E o problema é esse.

A nossa espécie desenvolveu-se e aumentou explosivamente de número graças a um conjunto muito específico de condições ambientais que permitiram, primeiro, a criação da civilização, e mais tarde o seu aprofundamento. Há muito quem nos julgue separados do ambiente, visto sermos hoje maioritariamente urbanitas, habituados e adaptados a condições cada vez mais artificiais, mas nada há de mais errado. Continua a ser o ambiente que nos permite a produção de comida para alimentarmos a multidão que hoje somos, e continua a ser o ambiente que vai tolerando a nossa construção de infraestruturas nos locais onde as vimos construindo há séculos.

E é isso, e não o planeta, que as alterações climáticas ameaçam. É o ambiente estável a que estamos habituados, a que ajustámos a nossa civilização, que está hoje em causa. São as nossas cidades costeiras que serão inundadas pela subida do nível do mar, são os mais produtivos territórios agrícolas do mundo que correm o risco de ficarem sem água à medida que a faixa desértica subtropical se expande para os polos, e são também os terrenos férteis que ficarão sob ameaça quando o mar for avançando rios acima. São as nossas vidas e o que construimos para as tornar mais confortáveis e até, por vezes, mais viáveis, que estão em risco com os fenómenos climatéricos extremos que tendem a tornar-se mais frequentes e violentos. Não é o planeta. Somos nós.

A biodiversidade é importante não porque sem ela o planeta morre, mas porque dela depende a descoberta de curas para doenças que nos matam ou a subsistência de organismos que exploramos para alimentação ou outros usos. Ou até, muito simplesmente, para nos dar ideias que sem ela não teríamos.

O aquecimento global deve ser travado não porque ele ameace de alguma forma o futuro da Terra, mas porque ameaça a existência de Lisboa, Londres, Paris, Nova Iorque, Tóquio, Luanda, Xangai, Rio de Janeiro e até de países e povos inteiros (as Maldivas, Kiribati, por aí fora). E também porque deixa tanto as populações forçadas a migrar para o interior dos continentes, como aquelas que já lá vivem hoje em dia, com muito menos território agrícola explorável e portanto sujeitas a sofrer uma deterioração significativa das condições de vida e, numa escala muito mais vasta do que aquela a que assistimos hoje em dia, e que já é inaceitável, de fome.

Não é, pois, salvar o planeta que nos deve importar. É salvar a adequação do planeta à espécie Homo sapiens. É isso que está em perigo: a nossa capacidade para continuarmos a sobreviver nesta bola azul perdida no espaço ou, no mínimo, para mantermos nela uma civilização pujante a funcionar.

O planeta, esse, facilmente sobreviverá. Nós é que provavelmente não.

 

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por Jorge Candeias às 21:22



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